Em estudo divulgado pelo Banco Central, o qual identificou a movimentação de R$ 3 bilhões em transferências via Pix, oriundas de beneficiários do programa Bolsa Família para sites de apostas online. Este dado desencadeou uma onda de preocupações e debates sobre o possível desvio de recursos destinados a famílias carentes.
No entanto, é possível compreender que a análise técnica do Banco Central apresentou algumas lacunas e potenciais imprecisões. A instituição admitiu que a margem de 15% utilizada nos cálculos poderia estar subestimada, além de não considerar outros meios de pagamento, como cartões de crédito ou transferências bancárias.
A perspectiva do setor de apostas sobre os gastos do Bolsa Família
Em resposta a esses números, o Instituto Brasileiro de Jogo Responsável (IBJR), que representa empresas líderes do setor de apostas online, contratou a LCA Consultoria Econômica para conduzir uma análise mais detalhada. Conforme o estudo da LCA, o valor real gasto pelos beneficiários do Bolsa Família em apostas online durante o mês de agosto foi estimado em R$ 210 milhões.
Esta cifra corresponde a apenas 1,5% dos R$ 14,1 bilhões repassados aos beneficiários naquele mês, uma fração consideravelmente menor em comparação aos R$ 3 bilhões inicialmente divulgados. A discrepância se deve, principalmente, à metodologia adotada pelas empresas de apostas para calcular os valores movimentados.
Entendendo o cálculo das apostas e o retorno do gastos
O levantamento realizado pelas empresas de apostas leva em consideração não apenas o valor enviado à plataforma, mas também o dinheiro que retorna ao jogador na forma de prêmios e as taxas retidas pelas empresas. Este cálculo é baseado na taxa de retorno ao jogador (RTP), que representa a porcentagem do dinheiro apostado que volta ao apostador em caso de jogos infinitos.
De acordo com o IBJR, a taxa de RTP praticada pelas empresas associadas no Brasil é de aproximadamente 93%, superior ao mínimo exigido pela regulamentação do setor, que estabelece um índice mínimo de 85% a partir de janeiro de 2025.
O impacto da regulamentação das apostas esportivas
A controvérsia em torno dos gastos dos beneficiários do Bolsa Família em apostas online ressalta a importância da regulamentação eficaz deste setor. Atualmente, no Brasil, as apostas se encontram em um período de transição, onde as regras para as apostas online ainda estão sendo implementadas.
Com a ausência de uma regulamentação consolidada, não há garantias de que os sites de apostas estejam praticando um retorno mínimo ao jogador, o que pode resultar em perdas financeiras significativas para os usuários. Além disso, a falta de controle e dados oficiais torna difícil avaliar com precisão o tamanho e o impacto deste mercado.
A tributação das casas de apostas
Outro aspecto a ser considerado é a tributação das empresas de apostas online. De acordo com os cálculos da LCA, a tributação dessas empresas antes da reforma tributária ficará em torno de 27% sobre a receita, levando em conta impostos como PIS/Cofins, ISS, IPRJ, CSLL e uma alíquota adicional de 12% criada pela lei nº 14.790/2023, que regula o setor.
No entanto, o setor pressiona o governo para se manter fora do imposto seletivo, aplicado a produtos e serviços considerados nocivos à saúde. Segundo a Associação Nacional de Jogos e Loterias, se as empresas de apostas forem incluídas nesta categoria, a tributação poderia chegar a 48% da receita.
Medidas para desincentivar o jogo excessivo
Diante das preocupações sobre o impacto das apostas online, especialmente para as famílias mais vulneráveis, profissionais de saúde têm defendido o aumento da tributação sobre esses sites como uma medida para desincentivar o jogo excessivo. A lógica por trás dessa abordagem é que os custos tributários mais elevados seriam repassados aos consumidores, tornando os gastos com apostas mais evidentes e, consequentemente, menos atrativos.
No entanto, é importante ressaltar que a regulamentação e a tributação adequadas não são as únicas soluções para lidar com os desafios relacionados às apostas online. Também é fundamental investir em programas de conscientização e prevenção da dependência em jogos, bem como oferecer suporte e tratamento para aqueles que enfrentam o vício.
O tamanho do mercado de apostas
Além das questões relacionadas aos gastos dos beneficiários do Bolsa Família, é preciso compreender o tamanho real do mercado de apostas online no Brasil. Conforme o estudo da LCA, o mercado deve ser avaliado com base na receita, e não no valor total movimentado, que pode variar de R$ 216 bilhões a R$ 249 bilhões, conforme o estudo do Banco Central.
Utilizando essa abordagem, o tamanho do mercado de apostas online no Brasil seria estimado entre R$ 34,9 bilhões, conforme a margem do Banco Central, e R$ 16,3 bilhões, segundo a margem de 7% dita pelas empresas de apostas. Essa faixa de valores representa entre 0,1% e 0,3% do consumo das famílias brasileiras, uma fatia relativamente pequena em comparação com outros setores da economia criativa e da cultura, que representam 10,8% dos gastos familiares, de acordo com um estudo do Itaú.
Recursos de apoio e tratamento
Para aqueles que já enfrentam problemas relacionados ao jogo excessivo, é preciso haver recursos de apoio e tratamento disponíveis. Organizações como os Jogadores Anônimos do Brasil e o PRO-AMJO (Serviço do Instituto de Psiquiatria do Hospital das Clínicas da USP) oferecem suporte e orientação para indivíduos e famílias afetadas pelo vício em jogos.
Além disso, os serviços de saúde pública, como as Unidades Básicas de Saúde (UBS) e os Centros de Atenção Psicossocial (CAPS), também desempenham um papel fundamental no encaminhamento e tratamento de pacientes com transtornos relacionados ao jogo.